Os condôminos desrespeitam limites da vaga de garagem, e agora?

Quando falamos sobre condomínios, muitos temas podem ser objeto de conflitos envolvendo a coletividade, entre eles, vagas de garagem. E dentro deste assunto, um em especial é bem delicado, porque demanda compreensão documental e legal, além de bom senso e respeito: é o uso irregular da vaga, seja por causa do tamanho dos veículos ou pela forma como são estacionados (fora dos limites).

Assim como tudo que existe em condomínios possui regras, a vaga de garagem, além de também ser regulada por normas gerais (trazidas pela própria legislação, é importante ressalvar esse ponto), pode ainda ser objeto de definições criadas pela coletividade, gerando um grande dilema aos administradores quando desrespeitadas.

Como a vaga é uma parte da propriedade exclusiva de cada um dos possuidores, alguns se veem no direito de usar e fruir seu “bem” ou “patrimônio” da forma como entendem, sem regras ou sem respeitar as limitações inerentes ao próprio espaço físico da vaga e da garagem. O uso da vaga por veículos que não cabem no espaço, ou mesmo carros estacionados irregularmente, nunca é visto como uma ilicitude pelos infratores, pois, afinal, eles acreditam que por ser propriedade particular, eles, condôminos, não deverão ser incomodados. Mas seria correto tal pensamento?

Óbvio que não, senão vejamos:

– Assim como em uma sala de estar de um apartamento pequeno não podemos colocar um sofá gigante ou uma mesa quadrada de oito lugares, também na vaga de garagem não se pode estacionar qualquer veículo!

– Outro exemplo: ninguém tenta acomodar uma cama ‘box King’ em um quarto de hóspedes de solteiro. Por que acha então que poderá abrigar duas camionetes em uma vaga delimitada para comportar dois veículos de porte médio, segundo prevê a legislação municipal?

Observe-se que, da mesma maneira como os cômodos de um apartamento, a vaga de garagem é propriedade exclusiva do condômino. No primeiro caso, ele aceita com tranquilidade as limitações impostas pela área interna de seu imóvel, bem como pela distribuição dos cômodos. Por que não poderia ter o mesmo bom senso em relação à vaga de garagem? Por que não medir a vaga antes de comprar o apartamento?

– Em residências unifamiliares, a situação não é diferente, também existem limitações de espaço em garagem, e muitas vezes, apesar de se morar em casas, não é possível possuir uma picape cabine dupla.

Então, é incongruente a insistência de muitos proprietários em acharem que tudo podem num condomínio, afinal, as áreas e espaços nos edifícios não se multiplicam, pelo contrário, são ainda mais restritas do que em imóveis unifamiliares.

A verdade é que a falta de cultura e de pensamento coletivo faz com que os conflitos deste porte cheguem às portas do Judiciário, como se essa instância pudesse arbitrar um meio mágico de alargamento do espaço! Ou como se pudesse evitar que o estacionamento irregular, ultrapassando os limites da vaga, venha a causar desconfortos aos demais proprietários!

A legislação é clara, o condômino é proprietário de uma área definida ou em especificação coletiva, ou em matrícula. Desta maneira, o proprietário deve seguir as normas condominiais: usar livremente o espaço para estacionar seu veículo apenas dentro das delimitações originais da vaga e, quando atravessar as linhas divisórias, em caso de manobras, por exemplo, não prejudicar terceiros, conforme definem os artigos 1.331 e 1.335 do Código Civil.

Romper tal pensamento beira ao uso nocivo da propriedade e depõe contra o princípio de viver coletivamente e também do morar respeitando o próximo. E ao síndico não resta alternativa senão advertir, multar e, se for o caso, utilizar outros recursos para a solução de um conflito criado pela falta de compreensão, de forma a que outros direitos individuais sejam preservados.

Matéria publicada na edição – 203 de jul/2015 da Revista Direcional Condomínios

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Autor

  • Cristiano de Souza Oliveira

    Advogado Condominialista e Consultor Jurídico há 29 anos; Mediador Judicial e Privado cadastrado perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Integrante Convidado da Comissão Especial de Administração de Condomínios do CEAC do CFA e do Grupo de Excelência de Administração Condominial – GEAC do CRA/SP; Autor do livro Sou Síndico, E agora? Reflexões sobre o Código Civil e a Vida Condominial em 11 lições; Coautor do livro Transparência em Condomínios Edilícios – A essência da boa gestão – Coleção Síndico Administrador; Colunista em diversas revistas e jornais do segmento; Professor de diversos cursos das áreas Condominial, Imobiliária, Mediação e Arbitragem; Sócio-fundador da Advocacia Cristiano De Souza; Diretor Jurídico do Instituto Educacional e de Pesquisas – Encontros da Cidade – IEPEC.

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